FAZENDA DUAS BOCAS
Nova perícia confirma que Álvaro Vasconcelos invadiu propriedade
Há 40 anos, familiares do agricultor Antônio Cândido tentam provar que são os verdadeiros donos da terraHá 40 anos, os herdeiros do agricultor Antônio Cândido José da Silva tentam provar que parte da Fazenda Duas Bocas, localizada no Benedito Bentes, em Maceió, pertence a eles. Documentos que comprovam a posse estão anexados ao processo, e até testemunhas de quem vendeu a propriedade rural ao agricultor são apresentadas como provas concretas. Embora o imbróglio pareça não ter fim, um novo laudo pericial confirma que a área foi invadida pelo empresário Álvaro José do Monte Vasconcelos.
No último dia 6 de janeiro, o documento que faz parte do processo nº 0005763-13.1984.8.02.0001 foi entregue pelo engenheiro civil perito Ciro Rezende Medeiros à 4ª Vara do Fórum de Maceió. No entanto, o levantamento topográfico foi executado em 20 de julho de 2024. Para a realização do trabalho, foi analisada a escritura anexada aos autos. Além disso, todos os documentos juntados ao processo foram levados em consideração.
No parecer conclusivo, o técnico aponta que o imóvel, “conforme fotografias registradas no dia da perícia e o trabalho de topografia realizado, juntamente com seu memorial, reforça o que consta na escritura da terra em questão. A terra a ser discutida, segundo o levantamento topográfico, pertence à Fazenda Duas Bocas, adquirida por Antônio Cândido José da Silva, que é representado pelo sucessor Serzedelo Cândido da Silva. O estudo topográfico indica também que, mesmo com a realização da segunda perícia, o levantamento topográfico mostrou que as medidas e os locais indicados, de acordo com as escrituras do imóvel, são as mesmas do primeiro laudo pericial entregue por este perito”, diz o laudo, que foi elaborado com base nas normas NBR 14653-3 e NBR 13133.
Pela segunda vez, a área foi analisada, e o mesmo profissional realizou o procedimento. Isso ocorreu porque o Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL) anulou a primeira perícia devido à ausência do assistente de Álvaro Vasconcelos durante os trabalhos. Assim, o Tribunal autorizou outra perícia na área, que desta vez foi feita com a presença de Flávio Laranjeiras, assistente técnico de Vasconcelos. “Com todos os procedimentos legais, confirmou-se mais uma vez a invasão do réu Álvaro Vasconcelos”, disse um dos herdeiros do agricultor, que aproveitou para destacar o profissionalismo do perito Ciro Rezende e do juiz da 4ª Vara Cível da Capital, José Cícero Alves da Silva, responsável pelo processo.
Vale ressaltar que a última movimentação no processo data do último dia 8 de janeiro, quando a Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Alagoas intimou as partes para se manifestarem sobre o laudo pericial (fls. 1002-1022) no prazo de quinze dias, ou seja, até o dia 10 de fevereiro de 2025.
O CASO
O processo tem tramitação prioritária, mas se arrasta desde 1984. Tudo começou há 40 anos, quando Álvaro Vasconcelos invadiu a propriedade rural de Antônio Cândido, devastou a lavoura, fez ameaças e expulsou a família de suas terras, conforme depoimentos e documentos anexados ao caso. Desde então, o agricultor, que não aceitou tamanha injustiça, recorreu à Justiça para reverter o pedaço de terra. Era de lá que tirava o sustento da família.
Lutou até morrer “de desgosto” em 2001. É assim que descreve o filho de Antônio, que relembra que, desde aquele episódio, o pai nunca mais foi o mesmo. Por não aceitar a situação, a cada dia parecia morrer um pouco mais. Mesmo expulso de suas terras, o agricultor não se intimidou. Buscou forças, reuniu documentos, incluindo o mapa que aponta o primeiro dono, datado de 1912, e entrou com uma ação demarcatória. O pedido caducou na Justiça e precisou esperar 18 anos para ser acatado. Mesmo assim, as irregularidades no caso só aumentaram. A luta, que era de Antônio Cândido, agora é dos herdeiros, que buscam recuperar seu pedaço de terra.
Nessa batalha, Antônio Cândido nunca esteve só. Sua esposa, Lindinalva Maria dos Santos Silva, foi valente e viveu para assistir a inúmeras irregularidades no processo. Anos de saúde fragilizada devido ao estresse não a impediram de lutar. No entanto, ela também não suportou a injustiça e faleceu no dia 29 de novembro de 2022, sem ter as terras de volta. Agora, o legado de luta ficou para os filhos que restaram, já que nem todos estão vivos para lutar, clamar e pedir por Justiça.
O processo é rico em detalhes, e tudo aponta que Antônio Cândido é o verdadeiro dono da área em questão. A divisão das terras da Fazenda Duas Bocas aconteceu em 1954, quando o antigo proprietário, Zacarias Trindade, vendeu o Engenho Duas Bocas, dividindo-o em três partes. Um dos lotes foi adquirido por Hélio Vasconcelos, pai de Álvaro Vasconcelos; a segunda parte foi vendida ao Hospital Colônia Sebastião da Hora; e a outra, a Antônio Cândido. Álvaro Vasconcelos herdou o lote comprado por seu pai, mas queria usufruir de toda a área. Comprou os hectares pertencentes ao hospital e, como o agricultor recusou vender sua parte, invadiu e usufrui dela desde então.
Antônio Cândido e Lindinalva foram vencidos pelo “desgosto”. Agora, a saga pela posse dos 150 hectares da Fazenda Duas Bocas segue com os filhos do casal.